O vento canta alguma harmonia antiga suave entre as árvores seculares. A chuva cai mansamente quase não a molha, a sombrinha vai tranquila sobre sua cabeça ignorando os respingos mais abaixo, pernas, mãos. Os sapatos marcam o passo antigo. A mente não está lá. O caminho desenhado há muito tempo. Ela não teve coragem de mudar. Ele teve.
A conversa não fora fácil. A verdade dita assim tão de fronte machucava, doía. Mas era ferida de um único corte. Profundo, mas único. Melhor que o espinho encravado acomodado lá. Alguns ponto e a alma assumiria finalmente a cicatriz. Ela sabia. Ela desejava. A tristeza nunca deveria ter sido eterna. Não seria. Não por ele. Não dele. Ela ainda carregava o preenchimento que sentiu quando o viu a primeira vez. Soubera que o mundo se desenharia diferente a partir daquele momento. E se desenhou. Não como ela queria entretanto.
O vento gelado, soprando cada vez mais forte, a embalava de perto, tentando atingi-la através do casaco e lenço. Não conseguiria. Não agora. Há pouco estava com ele mais perto do que nunca. Respirara o mesmo ar que ele. Estava com ele no seu colo mesmo depois da eternidade longe. Mas o caminho ainda seria longo. O pé pisa na água turva empoçada. Seguia mais gelado. Ela sabia: as cartas na mesa pediam atitude. Dele. Dela. Não o perderia de novo. Daria o que ele precisava. O que ele sempre precisou e a porta fechada não permitira o acesso. Ele em seu casulo. A chuva escorre pela sombrinha que ela aperta com mais força. Segue.
Todos os dias passado à frente daquela porta. Esperava uma fresta. Uma luz. Um sopro. Ele apagado lá. O coração batia a miúdo diante da madeira, sulcando seu rosto, prateando seu longo e negro cabelo. Ela já não ouvia sua voz. Quando o via: etéreo. Uma brisa flutuando a caminho do casulo. Ela sabia que ele não estava lá. As falas, os carinhos, o cerco haviam terminado há séculos. Pouco a pouco eram só ela e ele. A casa. Sem mais tardes de pipoca, filmes. Sem mais festas durante os reencontros. Hoje ganhara um leve roçar, mas tinha gravado em sua pele. Os outros não mais existiram.
As paredes escureceram. As cortinas se fecharam sem que ela se desse conta do breu a sufocando lentamente. O céu agora ameaça iluminar, embora a penumbra se mantenha. Algumas, poucas, nuvens pintam-se levemente entre púrpura e tangerina lá longe, tentando desenhar um possível fim de tarde. Ela sabe que agora o caminho era mais próximo do certo. Longe das velhas pedras enfincadas sobre seus pés.Deixaria para trás toda a lama escura. Talvez a cantiga triste cantada aos velhos pinheiros ficasse para trás também. Mas não. O vento rufla com mais força. Ela abaixa a cabeça. Firma os passos. Inclina o corpo para frente. Não daria nenhum passo atrás. A sombrinha impedia um passo mais rápido. Força. Frio. Gelo. Seu peito ia protegido sob o casaco. Sob o manto. Perto da pele, a corrente de ouro fino, com dois pingentes embolados, uma aliança grosseira riscada e um bonequinho de enfeites em ouro branco, gelava queimando o colo.
A chuva caí agora em gotas grossas, cortantes, batendo com raiva nas pedras encardidas, espirrando ardida por suas pernas nuas sob sua saia de lã escura. Ela sabe que suas pernas estão sendo marcadas pela lama daquele caminho.Por trás de chuva pastosa de escuridão, que de repente tomou o céu do caminho novamente, Ela pode ver a silhueta da casa. Sua velha casa com uma pequena luza fraca na varanda. As janelas há muito fechadas. A porta que abriria com um resistência pesada e um grande barulho surdo, como se reclamasse do incômodo. Ela está perto agora. A saia de lã está pesada com a água que respinga com força nas pernas e que não a quer abandonar. Suas pernas finas, brancas, manchadas. O sapato carrega a lama de todo o caminho. A lama que ela não queria com ela. Pisa com força nas pedras. Não quer essa marca no seu chão, quando ela finalmente alcançar a luz oscilante na varanda.
Ela pode ouvir claramente o rio furioso. Seus olhos cinzentos não o alcançam ver. O céu já se desligou totalmente. Com certeza, o Sol já se pôs oculto em nuvens e chuva. Com certeza, não haverá luar hoje. Mas o rio ignora totalmente todas essas sutilezas. Passará impiedoso
segunda-feira, 13 de junho de 2016
domingo, 1 de maio de 2016
Até a ideia ser só uma brisa gelada
O mundo pousa duramente no seu peito. Respirar dói. Cansa. Fatiga. Consulta mais uma vez o celular. Não há mensagem dele. Não sei por que espero. Elas não virão. Ele não virá. Sente-se de novo no olho do furacão, o mesmo em que entra e sai há anos. Queria ser forte. Queria poder gritar bem alto que parasse, que nunca mais voltasse. Queria correr, correr, correr até a ideia ser só uma brisa gelada que talvez brinque levemente com seus cabelos ou roce suas pernas cansadas de chegar à beira do mar, do outro lado do mundo.
Sentaria na areia branca e empedrada. Afundaria as mãos para sentir o cascalho e e tentar criar raízes ali. Virar árvore. Grande. Firme. Longa de alcançar o céu. Aqui, olhando o infinito se fundir. Longe. Tão longe que não seria possível ver mais nada.Tão longe que não haveria memória. Tão longe que não haveria você. O mar azul avançaria cauteloso e, sem se importar com a decisão de ficar, umedeceria as bambas raízes fincadas na areia e só a envolveria em azul.
Sem as raízes que acharia que teria. Sem o infinito absoluto que a deixaria respirar às vezes, mas a lembraria que ele ainda poderia vir. O vento mais forte que sacudiria seus galhos a faria saber que ele ainda existe.Porém, ela já seria anil, entre gotas e estrelas.Tentando se livrar da dor. Do medo. Da casca. Não há raízes no negro infinito abaixo. Não há asas para o firmamento que se desenharia muito acima. Fechada em sua própria bolha. À deriva das correntes. O mínimo movimento a sufocaria. Perdida na imensidão. Solta no meio do abismo.
Um suspiro mais forte. Ainda não há mensagem. Não haverá mais. O mundo se enraíza no seu peito e ela se dilui em seu próprio oceano.
Sentaria na areia branca e empedrada. Afundaria as mãos para sentir o cascalho e e tentar criar raízes ali. Virar árvore. Grande. Firme. Longa de alcançar o céu. Aqui, olhando o infinito se fundir. Longe. Tão longe que não seria possível ver mais nada.Tão longe que não haveria memória. Tão longe que não haveria você. O mar azul avançaria cauteloso e, sem se importar com a decisão de ficar, umedeceria as bambas raízes fincadas na areia e só a envolveria em azul.
Sem as raízes que acharia que teria. Sem o infinito absoluto que a deixaria respirar às vezes, mas a lembraria que ele ainda poderia vir. O vento mais forte que sacudiria seus galhos a faria saber que ele ainda existe.Porém, ela já seria anil, entre gotas e estrelas.Tentando se livrar da dor. Do medo. Da casca. Não há raízes no negro infinito abaixo. Não há asas para o firmamento que se desenharia muito acima. Fechada em sua própria bolha. À deriva das correntes. O mínimo movimento a sufocaria. Perdida na imensidão. Solta no meio do abismo.
Um suspiro mais forte. Ainda não há mensagem. Não haverá mais. O mundo se enraíza no seu peito e ela se dilui em seu próprio oceano.
terça-feira, 12 de abril de 2016
Nos desenhos animados, as personagens mais preguiçosas são acordadas com baldes d'água na cabeça. Na vida real, pode ser uma verdadeira tormenta de meses, despejando cântaros dia e noite, com breves períodos para poder sentir levemente a sanidade, antes do mundo cair de novo.
Houve um tempo quando a vida era boa. O céu era baunilha. Podia jurar que sempre houvera um arco-íris ali, entre aquela árvore e aquela casa amarela, embora não haja registro de chuva nesse período, o sinal de paz entre os Céus e a humanidade estava lá. Podia jurar.
Hoje não há mais céu, somente um borrão cinza escuro. A árvore talvez fora cortada. Com certeza não há mais casa amarela. Mas naquele tempo sim. Quando voltava da escola, a casa amarela sorria dentes azuis de chiclete, abria os longos e macios braços e a acolhia no aconchegante aroma de fome que podia ser sentido desde a três quarteirões.
Houve um tempo quando a vida era boa. O céu era baunilha. Podia jurar que sempre houvera um arco-íris ali, entre aquela árvore e aquela casa amarela, embora não haja registro de chuva nesse período, o sinal de paz entre os Céus e a humanidade estava lá. Podia jurar.
Hoje não há mais céu, somente um borrão cinza escuro. A árvore talvez fora cortada. Com certeza não há mais casa amarela. Mas naquele tempo sim. Quando voltava da escola, a casa amarela sorria dentes azuis de chiclete, abria os longos e macios braços e a acolhia no aconchegante aroma de fome que podia ser sentido desde a três quarteirões.
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