segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Poema de Anna Beatriz Dias Paladino

(Poema da minha aluna Anna Beatriz, aprendiz de poetisa)

Caminhava ao sol da tarde
quando um som ouviu
o som de uma viola
e a viola tocava tocava
mas foi interrompida
o som de um tiro no peito
já na madrugada esquecida.

O porquê disso não sei
pois nada de errado o violeiro fazia
Mas quem sou eu para julgar
quem eu não conhecia.

Ao ver o pobre moço
com a viola junto ao peito
com seu tiro certeiro
eu sentia.

Sentia que conhecera o coitado
sim, lá da porteira
onde vivia.

Perdeu a esposa, filhos e família
mas não perdeu o dom da viola que tinha.
Assim partiu o pobre homem
que da viola dependia.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Poema desabalado


O coração em descompasso
tal qual galinha d'angola
- fraco fraco!

A vida despedaçada
como aquela vidraça
daquela casa amarela
esquecida na esquina.

A luz fragmentada
pelo abajur de vidro colorido
um pouco aqui
muito lá.

O frio intermitente
do inverno eterno
no tiritar dos ossos.

A fantasia cai desfolhada
na rua ocupada
pela multidão marchando
para lado algum.

O chão desmanchado
como o penteado
daquela criança vermelha
na manhã de agosto.

A saída fechada
de repente
com o vento forte do leste.

Nua, descabelada, desfigurada.

Não há meio de fuga.

Naquele instante,
é engolida.

Evapora-se
_______em inebriante e fugaz
______________perfume de café
_____________________fugindo pela janela entreaberta
____________________________de um apartamento qualquer.



quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Mais um passo


O pé direito da sala aumenta a sensação de infinito. A porta se abrira sozinha. Será que fora o vento? Atrás ficaram o céu negro e as árvores revoltas balançando os braços. Um clarão rápido iluminou os detalhes de um quarto sobre a escada desdentada e um retrato solitário na parede sobre a poltrona. Era uma moça ou talvez um menino.Talvez devesse voltar. A casa certamente era propriedade de alguém, alguém esquecido naquele quarto.

Da porta de entrada, podia ver movimento mais acima. Um vulto ou uma cortina ou um ganho que entrou no quarto por meio de uma janela negligente. O breu do céu agora adentra a sala. O quarto desaparece na escuridão.

Dá um passo a frente. Quem sabe ainda seja possível fugir? Assumir essa história, ser aquela mulher ou ter aquela criança? Entrar no quarto, se envolver no voil da cortina e sair dançando sobre os galhos pelas nuvens de algodão negro.

Mais um passo. Ainda é possível um último olhar para o retrato. Poderia ser um homem jovem com trajes de passeio. Seria seu pai? Seu marido. O pai da criança que teve, ou teria. Eles se conheceriam naquele dia, passeando pelo campo ou pelo Jardim Botânico.

Os tacos do soalho se soltam. O próximo passo pode ser perigoso. Paralisa. O resquício de luz ilumina a poltrona sob seu retrato. Sim, era ela lá! Ou não.

Sente a aspereza do pano grosso, velho duro pela sujeira de tanto tempo. O gosto de terra invade suas narinas e nauseiam o estômago. Ele estava sentado lá, enquanto seus dedinhos fininhos desenhavam silenciosamente as figuras do tecido.

Há quanto tempo?

No fio de sombra que ainda resta, o corpo se rascunha com grãos de poeira sobre o pano verde e gasto da poltrona. Ele ainda está lá.

Mais um passo somente. Avança devagar, enquanto o corpo quer voltar. Só mais um passo. Devagar põe o pé no chão. Sabe que os tacos podem não suportar. Sabe que pode não chegar. Ela vestida de voil em meio ao algodão negro no breu que toma quase toda sala.

O rosto ainda não é visível. O coração bate na boca. Nos pés, o soalho balança ao sabor dos ventos. Precisa chegar. Só mais um passo com calma. Ainda é possível. Precisa ver. Precisa tocar.

O vento entra com força. A luz e a poeira formam um estranho e pequeno redemoinho. O chão numa gangorra infantil. Estica o braço a tempo de sentir a rigidez do tecido de repente enegrecido antes de cair na profundeza sem fim da memória.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Numa caixinha


quero te guardar numa caixinha
e deixar sempre assim pertinho do meu coração

quero te tocar devagarinho
e sentir de repente teu calor na minha mão

quero te ver com gosto de carinho
com a luz dos teus olhos afastando a distância e a escuridão

chega de mansinho
toma na minha boca o amor que vem de dentro

sentimento que transborda os poros
e entrelaça teu corpo no meu



segunda-feira, 11 de junho de 2012

combustão


Precisava lhe falar

sobre frio percorrendo minha espinha
ao lhe sentir perto
mirando meu pescoço

sobre o calor que sinto
quando sua boca acha a minha

sobre o turbilhão que me invade
toda vez que seu corpo completa o meu.

Queria que soubesse
como a sua cor mistura com a minha
de um jeito difícil de entender
tão simples para acontecer.

Será que sabe das suas digitais em mim?

A sua presença permanece depois você já foi
arrepios sazonais.

O dia na espera da sensação
seu hálito na minha nuca
mais uma vez.


segunda-feira, 28 de maio de 2012

céu vermelho


céu vermelho
nuvens brancas na noite clara
o vento gelado corta a alma em fatias finas
mas ainda não ameniza
a angústia

talvez chova
mas não importa
talvez chore
pouco importa

a dor não sairá
está escondida
nas voltas que o sangue dá no coração

o grito não dado arranha a garganta
o gosto amargo permanece na boca
o pulo inerte prega os pés no chão
o tapa continua gravado na cara
________________________e na mão

o vermelho escorrega das nuvens
a chuva vermelha esparrama o sangue no cimento ocre

quente

mas a dor ainda pulsa no corpo entorpecido
ininterrupta.

domingo, 6 de maio de 2012

Festa na Lua



Na noite iluminada
nuvens claras
os sapos se aquietam
a coruja dorme pensando que é dia
o sertão se aquece.

As estrelas se encolhem
dia de descanso
só ela brilha
soberana.

Estico o braço
toco a lua
São Jorge está lá
comendo queijo
com o dragão.

Olhando um pouco mais
quase posso ver Naiá e Narciso
casal formado no fundo do lago.

A Iara, que apresentou os dois,
também fora convidada.

Na beira da fogueira,
entre bries e cheddar,
Méliès e Verne conversam animados.
Wells mandou lembrança.

Armados de uma corda e um barbante,
desceram de lá
o Barão de Munchausen e Chicó
pra me contar o sucedido
antes de irem num cometa pra Maceió.

estico o braço
toco a lua
são jorgue está lá
comendo queijo
com o dragão

a noite segue iluminada
clara

sábado, 28 de abril de 2012

Ímã


estamos num grande labirinto
vivemos nos desencontros
num jogo de gato e rato

você sai
__________eu vou embora
você volta
__________eu não
você vai
__________eu chego

nossos tempos são diferentes
nossas águas não se misturam
temos densidades diversas

mas nossas essências se reconhecem
e, entre repulsa e atração,
não conseguimos nos afastar
nem nos encontrar



quarta-feira, 18 de abril de 2012

O silêncio da manhã

Gosto de ouvir
o poder do silêncio
ao amanhecer

o sol da manhã segredando
preguiçoso
com a pele ainda sonolenta

o orvalho sussurrando
quando volta para o céu
depois de uma noite de gandaia

o vento cantarolando
baixinho e compassado
as cantigas da noite
e os sambas do dia

o farfalhar das nuvens acordando
enquanto riscam o salão
para mais um dia de labuta

assim acompanho o despertar
em cada compasso
em cada nota.

...
Gosto do silêncio da manhã
que na sua ausência
preenche a sede da minha alma

domingo, 1 de abril de 2012

na sala de espera


espera por uma nova carta
por um novo presente
por uma palavra
que não chega

ainda deseja mais um toque
mais uma palavra
mais um beijo
que não aconteceu

anseia por mais uma conversa
por mais algumas risadas
por mais alguns planos
que não se realizarão

a vida na sala de espera
parada entre notícias velhas
olhando para a porta
na esperança do futuro
que não surgirá

terça-feira, 27 de março de 2012

domingo, 18 de março de 2012

sem a luz da lua


enquanto a lua se apaga
e sua luz vai desaparecendo na esquina
os sonhos aos poucos somem

a alma também se esvai
devagar
em busca de mais um instante
de mais um beijo
de mais um toque
de mais uma música

na contradança do tempo
me esqueço do brilho da estrela
me perco dos meus desejos

entre uma volta e outra
no escuro
meus passos se encaixam nos seus

sem meu controle
a vida segue seu compasso
sua cadência

sábado, 17 de março de 2012

o céu se pinta de vinho
devagar o sol vai iluminando os caminhos

Uma palavra
um toque
a voz na alma

No corpo
o vazio

céu de baunilha
nuvens de algodão

a água
encharcando a alma
pesa
expulsa

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Entre dois pontos






a alma rasgada entre dois pousos
o ninho
o pasto

o corpo liquefeito
na estrada
entre os dois rios escuros

o céu se pinta de vermelho
descem as nuvens para conferir o resultado
o sol, desdenhoso, vai sem olhar para trás

ficam só a nuvem,
que cobre o que resta do corpo e da alma,
e chuva,
que não sabe porque chora

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Bússola quebrada


Entre idas e vindas,
eu me perdi
não sei cadê meu norte.

O querer perdido
entre planetas
entre nuvens
nos mares do sul.

Não sei mais onde procurar
mas sigo a busca
índice vazio.

Minha vida na bússola quebrada
na agulha torta
que aponta para o nada.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Num passe de mágicas


num passe de mágicas, está aqui
traz os livros
as músicas
a energia
a suavidade
talvez vinho

o tempo flui

entre vontades e vibrações
sentir
o distante perto num instante

a vida vai ficando mais leve
equilíbrio necessário

costurados na conversa
o dia de labuta
a família
a distância
as dores
passando
pelo reino de Poseidon
pelo calor do sertão
pela terra distante...

e postos assim
na tranquilidade da vida em curso
deixam
por fim
a alma acalantada...

domingo, 22 de janeiro de 2012

O sentimento perdido


os versos perdidos entre papéis
nos cantos dos livros
no rascunho ao lado do telefone

palavras que tentam
em vão
remontar na alma
o sentimento perdido...
há quanto tempo?

não sabe
sua vida secou
ele viu sua poesia esvaindo
rio intermitente
deixando-o assim
no barco parado
sem peixes
a pé no caminho duro

os versos perdidos entre papéis
são precipitações no deserto
evaporam antes de tocar a pele
e ainda o deixam assim
seco
sedento
olhando para o céu
a procura de uma chuva
que o encharque
que encha seu caminho

tolo
não sabe que a poesia que procura está lá
perdida ainda na alma
tentando sair
e se dissipando
entre versos nos papéis de rascunho

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012