segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Aula de Biologia

(Ao Prof, e quase Dr, Rodrigo Zieri e sua aula inspiradora)
A rã
Estava quieta 
Sossegada 

Mas seu namorado todo cheio de bossa de si 
E de papo 
Começou a cantoria.

 Na beira da lagoa 
Depois do dia quente 
Depois da chuvinha gostosa
 O namorado queria 
Só Namorar. 

 Os vizinhos chiavam 
Aquela barulheira 
Aquela cantoria 
Enchia o saco 
Colorido. 

 A rã não ouvia reclamações 
Só tinha olhos e ouvidos para ele. 

Seu namorado 
Foi chegando de mansinho 
E a abraçou 
Abraço Nupcial. 

Um ninho de espuma 
Pintas coloridas 
Filhotes coloridos. 

 Mas o namorado
 Foi-se embora 
O coração da rã fatigado 
Ficou fatiado 
Em milímetros por navalhas de diamante.

Mas só até 
A próxima noite 
Quente 
Depois da chuva... 

 Afinal Desde girininha 
A rã carrega 
Poesia 
Nas suas células Hematopoéticas.

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Noite sem fim



Gosto quando a lua surge assim 

Bem grande 

Como um grande prato de sopa 

Clara e brilhante 


E, então, tenho a sensação que

Por mais longa que seja a noite

Amanhã 

Talvez 

Eu não amanheça perdida



Busca

Texto (parcialmente) desenvolvido durante oficina "Tecendo Lagartas" da Suzanna Buzato


Corpo pelas ruas
Busca seu espelho
Deseja outra forma
Que só existe no mundo que não existe

Na ânsia utópica
Vomita vida de margarina

As vias sem rosas
O sol baunilha
Embaçam minha retina

Mas os passos pesados,
Que levam a cabeça dentro de si,
Não veem o céu além da esquina


quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Época das mangas

 Há alguns anos elaborei um livrinho de poesias infantis que contava as férias de Mimi na casa mágica da vovó. Nas arrumações de quarentena achei o projeto e ele acabou ganhando mais um poeminha...


Na mangueira grande grande de encostar no céu

Passarinho come manga

Macaco come manga

Periquito come manga

 

Quando caem amarelinhas

A tartaruga, que é um jabuti, come manga

Os cachorros comem manga

Os cavalos, e o burro também, comem manga

 

Se eu quero manga

Vovó vai lá no mercado comprar por 79 centavos o quilo


sábado, 25 de julho de 2020

Um grande lago salgado



E se a vida for de verdade um grande lago salgado?
Nele não há sapos
nele não há peixes
nele não há nem aquelas plantas enroscadas nas pedras calçadas no fundo

Nele o corpo flutua sem resistência
 mas a pele resseca
 o cabelo resseca
os olhos ressecam

A face sempre olhando para o céu
no limiar corpo imóvel
não há ventos para mudança
não há substrato para o existir
nem há pássaros que possam ditar o caminho

Nele a vida é mal definida quando a água vem do céu
mas nesse inverno seco
dessa Terra seca
são meses sem chuva
são meses de sal

Ainda assim, olha lá:
o corpo resiste dissecado nesse lago salgado e estéril

domingo, 29 de setembro de 2019

pernas e plumas


Primeiras chuvas da primavera
O verde acordou,  o ar acalmou e ovos cumprem seu papel
Deles nascem com 2/3 de pernas e plumas
Pequenas bolotas pernudas e curiosas
Camufladas na grama recém esverdeada

Nasce também toda a brabeza que se pode ter em um único ser
Nasce a capacidade de enfrentar o cão, o homem  e o carro
Nasce a certeza que todos se curvarão a eles
Não há empecilho ou tamanho

Mas talvez tenham razão
São suas prioridades
São os os seus
E que o mundo a desvie de seu caminho



terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Tenho medo

A alma toda preenchida por medo
Medo pelos meus
Medo pelos seus

Medo pela sombra que saiu livremente ocupando as ruas e as escolas,
as praças e os hospitais
Medo pela onda que cresceu violentamente, ganhando mais corpo a cada dia
(e que ainda vai estourar na nossa cara)

Morreremos com a garganta seca de tanto pregar para ouvidos moucos?
Morreremos todos afogados no ódio que brota em cada fresta?

Tachados de loucos e alienados em uma terra de cegos e surdos.

Abro as mãos
Solto as amarras
E, por entre meus dedos,
Deixo você voar

Voar livre de volta para o meu passado
Aquele passado colorido, métrico e perfeito
Que nunca existiu

segunda-feira, 13 de junho de 2016

O Vento

O vento canta alguma harmonia antiga suave entre as árvores seculares. A chuva cai mansamente quase não a molha, a sombrinha vai tranquila sobre sua cabeça ignorando os respingos mais abaixo, pernas, mãos. Os sapatos marcam o passo antigo. A mente não está lá. O caminho desenhado há muito tempo. Ela não teve coragem de mudar. Ele teve.

A conversa não fora fácil. A verdade dita assim tão de fronte machucava, doía. Mas era ferida de um único corte. Profundo, mas único. Melhor que o espinho encravado acomodado lá. Alguns ponto e a alma assumiria finalmente a cicatriz. Ela sabia. Ela desejava. A tristeza nunca deveria ter sido eterna. Não seria. Não por ele. Não dele. Ela ainda carregava o preenchimento que sentiu quando o viu a primeira vez. Soubera que o mundo se desenharia diferente a partir daquele momento. E se desenhou. Não como ela queria entretanto.

O vento gelado, soprando cada vez mais forte, a embalava de perto, tentando atingi-la através do casaco e lenço. Não conseguiria. Não agora. Há pouco estava com ele mais perto do que nunca. Respirara o mesmo ar que ele. Estava com ele no seu colo mesmo depois da eternidade longe. Mas o caminho ainda seria longo. O pé pisa na água turva empoçada. Seguia mais gelado. Ela sabia: as cartas na mesa pediam atitude. Dele. Dela. Não o perderia de novo. Daria o que ele precisava. O que ele sempre precisou e a porta fechada não permitira o acesso. Ele em seu casulo. A chuva escorre pela sombrinha que ela aperta com mais força. Segue.

Todos os dias passado à frente daquela porta. Esperava uma fresta. Uma luz. Um sopro. Ele apagado lá. O coração batia a miúdo diante da madeira, sulcando seu rosto, prateando seu longo e negro cabelo. Ela já não ouvia sua voz. Quando o via: etéreo. Uma brisa flutuando a caminho do casulo. Ela sabia que ele não estava lá. As falas, os carinhos, o cerco haviam terminado há séculos. Pouco a pouco eram só ela e ele. A casa. Sem mais tardes de pipoca, filmes. Sem mais festas durante os reencontros. Hoje ganhara um leve roçar, mas tinha gravado em sua pele. Os outros não mais existiram.

As paredes escureceram. As cortinas se fecharam sem que ela se desse conta do breu a sufocando lentamente. O céu agora ameaça iluminar, embora a penumbra se mantenha. Algumas, poucas, nuvens pintam-se levemente entre púrpura e tangerina lá longe, tentando desenhar um possível fim de tarde. Ela sabe que agora o caminho era mais próximo do certo. Longe das velhas pedras enfincadas sobre seus pés.Deixaria para trás toda a lama escura. Talvez a cantiga triste cantada aos velhos pinheiros ficasse para trás também. Mas não. O vento rufla com mais força. Ela abaixa a cabeça. Firma os passos. Inclina o corpo para frente. Não daria nenhum passo atrás. A sombrinha impedia um passo mais rápido. Força. Frio. Gelo. Seu peito ia protegido sob o casaco. Sob o manto. Perto da pele, a corrente de ouro fino, com dois pingentes embolados, uma aliança grosseira riscada e um bonequinho de enfeites em ouro branco,  gelava queimando o colo.

A chuva caí agora em gotas grossas, cortantes, batendo com raiva nas pedras encardidas, espirrando ardida por suas pernas nuas sob sua saia de lã escura. Ela sabe que suas pernas estão sendo marcadas pela lama daquele caminho.Por trás de chuva pastosa de escuridão, que de repente tomou o céu do caminho novamente, Ela pode ver a silhueta da casa. Sua velha casa com uma pequena luza fraca na varanda. As janelas há muito fechadas. A porta que abriria com um resistência pesada e um grande barulho surdo, como se reclamasse do incômodo. Ela está perto agora. A saia de lã está pesada com a água que respinga com força nas pernas e que não a quer abandonar. Suas pernas finas, brancas, manchadas. O sapato carrega a lama de todo o caminho. A lama que ela não queria com ela. Pisa com força nas pedras. Não quer essa marca no seu chão, quando ela finalmente alcançar a luz oscilante na varanda.

Ela pode ouvir claramente o rio furioso. Seus olhos cinzentos não o alcançam ver. O céu já se desligou totalmente. Com certeza, o Sol já se pôs oculto em nuvens e chuva. Com certeza, não haverá luar hoje. Mas o rio ignora totalmente todas essas sutilezas. Passará impiedoso


domingo, 1 de maio de 2016

Até a ideia ser só uma brisa gelada

O mundo pousa duramente no seu peito. Respirar dói. Cansa. Fatiga. Consulta mais uma vez o celular. Não há mensagem dele. Não sei por que espero. Elas não virão. Ele não virá. Sente-se de novo no olho do furacão, o mesmo em que entra e sai há anos. Queria ser forte. Queria poder gritar bem alto que parasse, que nunca mais voltasse. Queria correr, correr, correr até a ideia ser só uma brisa gelada que talvez brinque levemente com seus cabelos ou roce suas pernas cansadas de chegar à beira do mar, do outro lado do mundo.

Sentaria na areia branca e empedrada. Afundaria as mãos para sentir o cascalho e e tentar criar raízes ali. Virar árvore. Grande. Firme. Longa de alcançar o céu. Aqui, olhando o infinito se fundir. Longe. Tão longe que não seria possível ver mais nada.Tão longe que não haveria memória. Tão longe que não haveria você. O mar azul avançaria cauteloso e, sem se importar com a decisão de ficar, umedeceria as bambas raízes fincadas na areia e só a envolveria em azul.

Sem as raízes que acharia que teria. Sem o infinito absoluto que a deixaria respirar às vezes, mas a lembraria que ele ainda poderia vir. O vento mais forte que sacudiria seus galhos a faria saber que ele ainda existe.Porém, ela já seria anil, entre gotas e estrelas.Tentando se livrar da dor. Do medo. Da casca. Não há raízes no negro infinito abaixo. Não há asas para o firmamento que se desenharia muito acima. Fechada em sua própria bolha. À deriva das correntes. O mínimo movimento a sufocaria. Perdida na imensidão. Solta no  meio do abismo.

Um suspiro mais forte. Ainda não há mensagem. Não haverá mais. O mundo se enraíza no seu peito e ela se dilui em seu próprio oceano.

terça-feira, 12 de abril de 2016

Nos desenhos animados, as personagens mais preguiçosas são acordadas com baldes d'água na cabeça. Na vida real, pode ser uma verdadeira tormenta de meses, despejando cântaros dia e noite, com breves períodos para poder sentir levemente a sanidade, antes do mundo cair de novo.
Houve um tempo quando a vida era boa. O céu era baunilha. Podia jurar que sempre houvera um arco-íris ali, entre aquela árvore e aquela casa amarela, embora não haja registro de chuva nesse período, o sinal de paz entre os Céus e a humanidade estava lá. Podia jurar.
Hoje não há mais céu, somente um borrão cinza escuro. A árvore talvez fora cortada. Com certeza não há mais casa amarela. Mas naquele tempo sim. Quando voltava da escola, a casa amarela sorria dentes azuis de chiclete, abria os longos e macios braços e a acolhia no aconchegante aroma de fome que podia ser sentido desde a três quarteirões.


segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Sopro


eu sopro
e você
em grãozinhos de areia
se vai
entre o meu beijo
e a brisa suave da memória

voando
sem asas
com o pó dos meus sentimentos
procurando algum canto perto do mar

entre as ondas e as espumas
algum lugar distante
pra descansar
pra me deixar esquecer

num sopro
dourado
brilhante
calmo
sem medo

e você
pra sempre
longe daqui



domingo, 6 de setembro de 2015

De cristal


De quando em quando, a vida esfrega com gosto em nossa cara que ela é mais frágil que aquele copo de cristal chique, que não suporta a sua esponja de lavar louça, e se rompe sem querer na sua mão. Pode ser depois da comemoração especial de ontem, com todos seus amigos e familiares celebrando sua aprovação no MBA em administração. Afinal aquele TCC quase tirou todo seu sangue e com quase certeza todas as suas horas de sono e boa parte da sua poupança. Seja, por falta de coisa melhor pra fazer, depois da sua ilustre ideia de tirar os (poucos) cristais da casa para limpar pela profunda falta de uso (ou de momento que você julgasse importante o suficiente para sacar as taças com bordinhas douradas e impecavelmente inúteis que por anos acumulam pó na cristaleira trancada na sala de estar).

A dia pode de repente desaparecer numa manhã, quase tarde, qualquer de trabalho.Durante o fazer diário. Depois de algumas décadas fazendo a mesma coisa.Talvez tenha acordado cedo. Preguiça, sono, comuns às 5 da manhã.  Talvez fosse uma sexta feira, poderia ser véspera de um feriado prolongado. Talvez fosse depois de um mês muito quente. Mês comprido, quase interminável, e seco. Talvez estivesse pensando no presente do neto, aquele menino lindamente arteiro e sapeca.Talvez pisasse onde sempre pisou.  Mas talvez não fosse o passo adequado. Talvez a vida tivesse que ser assobrada lentamente na frente de centenas de adolescentes histéricos (e adultos também fora do prumo), por que não sabem o que fazer. Não estava no script escolar, ensaiado e planejado e detalhado todos anos, que um corpo cairia cinco metros para ausência no corredor da escola, na frente das salas de aula. A telha quebrada, o barulho bem forte, a gritaria sem fim. A ausência e o sangue. Será que apesar do baque o protocolo prevalece?

Às vezes, o protocolo pura e simplesmente não existe. Às vezes ela decide ir doce embora. Sem explicação. Sem expectativa. Sem espera. De manhã cedo, antes da quentura o café ou do conforto do pão. Sem esperar um instante. Pro o último beijo. Pra última palavra. Quem sabe ainda tivesse o desejo de tocar mais uma música. Ontem deveria ter saído pra encontrar aqueles amigos que insistiam com a viola e a sanfona e a cantoria desafinada. Ontem devesse ter dado risada com eles. Ignorado os olhares tortos dos que não conseguem entender que, por vezes, não é na voz perfeita ou na inteligência aguçada ou no rosto harmonioso  que a felicidade faz morada. Que a alma sublime. Que nos faz em pleno voo. Devia ter tentado a plenitude ontem. Amanhã não existe. Caiu no breu com seu café, seu violão e sua voz. Silêncio doloroso.

A voz algumas vezes se cala quando ainda teria muito o que dizer. Muito o que gritar. Faltaram os berros que ele deveria dar para que o mundo olhasse para lá. Os olhos que vieram tarde demais. Os gritos de terror na água escura. A falta da força paterna. A falta da proteção da mãe. O frio e o medo invadindo de uma vez a alma. O corpo sendo levado agonizando pra praia. Devolvido nas areias de um resort. A vida interrompida quando devia começar. A dor eterna de um pai carregando parte dos horrores do extremo. O extremo que joga com o futuro como peões num  tabuleiro. Um grande jogo imobiliário. Construa casas pra ganhar, construa prédios, construa hotéis, assim a passagem custa mais cara. Mais cara que o aluguel da propriedade do Morumbi com quatro casas e um hotel no tal jogo de tabuleiro.  Para aquele pai, a passagem custou muito cara. Quanto custa as vidas de uma esposa e dois filhos? Quanto custará sua dor e seu peso por toda a vida?

A vida é um cristal fino, lindo, frágil e delicado, que ganhamos nosso nosso debut no mundo. Mas, apesar da fragilidade, deve ser usado e explorado todos os dias, o dia todo. Como aquela embalagem de requeijão com a data de validade impressa no fundo que serve de copo, de medida, de terrário, de enfeite improvisado em mesa de aniversário surpresa. O nosso cristal também deve ser explorado, seja pra comemorar o ar que entra (por vezes sem esforço, por vezes depois de uma força absurda).  Seja pra tocar uma bela música com eles meio vazios (ou meio cheios?). Seja pra celebrar essa vida que passará sem de onde, sem como, em um fechar e abrir de olhos. Seja pra juntarmos e exigirmos uma sociedade mais humana, mais digna. Uma sociedade que se indigne e que faça valer toda a importância e valor dos cristais que temos conosco.



De quando em quando, a vida esfrega em nossa cara que é mais frágil que aquele copo de cristal chique que não suporta a sua esponja de lavar louça e se rompe sem querer na sua mão, seja depois da comemoração especial de ontem, seja depois da sua ilustre ideia de tirar os (poucos) cristais da casa para limpar pela profunda falta de uso (ou de momento que você julgue importante o suficente para sacar as taças com bordinhas douradas e impecavelmente inuteis).
A dia pode simplesmente desaparecer num dia qualquer de trabalho. Talvez uma sexta feira vespera de um feriado prolongado depois de um mês muito quente, comprido e seco. Talvez ela possa ir na frente de centenas de adolescentes histéricos

quarta-feira, 1 de julho de 2015

A porta abriu devagar. Os olhos demoraram a se acostumar novamente à luz. Quanto tempo durou a viagem? O que importa? Tempo é um conceito antigo, de quando contavam as voltas que a Terra dava no escuro Sol.
O manto de um verde vivíssimo cobre a crosta rosada, tal qual grama, mas ela sabe que não é.
Pseudoplantas adaptadas ao pseudoplaneta adaptado para termos uma existência adaptada à nossa pseudovida.
O teto da cúpula de vidro cobre todo o céu fechando a cúpula. Saturno é assim somente uma sombra sob a projeção da antiga lua, sempre cheia e iluminando as aldeias programadas em torno de praças vazias.
Ela tem uma memória vaga, provavelmente adquirida de uma das muitas histórias que ouviu durante os anos de viagem. Histórias de uma praça arvorada, homens vendendo algo parecido com pequenos passáros brancos, quase pode ouvir o barulho ensurdecedor

Conselho de Classe


Mesma coisa
trabalho
casa
sala
rua
lua

Mesma coisa
Geografia
História
Biologia

Perdido entre inglês e espanhol
buscando um norte português

Rompe cabeças sem peças
vagas ações
nulas propostas
folhas no caminho

Matemática fora de esquadro
avaliação em branco

Na prova dos nove
o futuro chove cântaros
fora daqui


domingo, 28 de junho de 2015

RX



Chapa de um pulmão tísico
A velha bêbada flertando com Vênus
Marca o centro do peito azul escuro

Estrelas pingam rareadas
Onda fria cortando a pele fina
Osso a arrebentar

Coruja pia lá longe
Comprido e doído
Coração arde em febre aqui dentro
Arrepio e delírio
Caminho se esconde lá em frente
Curvo e turvo

Os pés congelados
Não sabem para aonde ir
Enquanto o mundo
Macera parcas decisões





domingo, 7 de junho de 2015

Sinal de Vida


Suor pela nuca
Cabelo úmido

Pálpebras em chumbo
Não há como mantê-las abertas

Força
Débil

Peito cansado
Mãos elípticas
Olhos nublados

Suor
Mãos em palma

A garganta cega
O que se há de fazer?

Navalha em foice
No caminho do peito paralítico

Sopro pelo ouvido oco
Arrepio
Devagar
Corda nina

Sangue transita lentamente
Ruas vazias
Com calma
A vida nas ondas suaves de sua linha







terça-feira, 28 de abril de 2015

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Implacável


A água cai implacável sobre o telhado. O barulho é ensurdecedor. Não há mais como dormir  Tem a certeza de que quer invadir a casa oca. Levar tudo para algum lugar distante. Talvez devesse abrir portas e janelas e deixar a vida ser lavada. Talvez devesse enfrentar a fúria que vem do céu avermelhado daquela madrugada rubra. Talvez fosse melhor o combate desigual. A luz forte ilumina o quarto escuro, em pouco tempo o barulho atinge as janelas sacudindo-as. O mundo vai acabar em água, raio e trovão.
A falta de energia, elétrica e vital, a impede de ter alguma reação maior do que se encolher debaixo das cobertas, que pouco protegem contra a paúra. Queria sair. Queria gritar mais alto que ela. Queria ter a coragem que os outros acham que ela tem. As sombras provocadas por instantes marcam sua memória sonolenta e tomam as formas do passado.
Tudo que não quer é pensar. Pensar nos caminhos encharcados e esburacados dos tempos verbais. Pensar na vida que retomará o curso eterno quando o relógio tocar. Pensar no uniforme já devidamente arrumado na cadeira ao lado. Pensar na inutilidade da sua vida vazia. Pensar no que existirá quando vencer todas as fases do jogo.
Vermelho recortado angularmente em agonia e cerzido às árvores negras. Está claro mas não o suficiente para iluminar o dia que, ela sabe, ainda há de chegar. Não hoje. Não sob os cântaros de água. Não sob esse céu. Não com a tempestade dentro dela.
O vento canta com os galhos. Canção antiga. Profunda. Comprida. Triste. Ela, no fundo, gosta de escutá-lo assim gelado. Mas o cenário tingido de sangue diluído a hipnotiza e assombra. Quase pode sentir o cheiro do ferro derramado. Queria a fé dos lobos para gritar que é mais forte e que não tem medo. Encara a dança das sombras dos galhos até as sombras invadirem novamente o quarto por dois segundos.
Um frio lhe percorre a alma e pára no seu estômago. Congela-o. Os vidros se debatem indefesos. Eles não resistirão muito tempo. Nem o telhado reclamando com razão. Nem ela.
Afasta as cobertas. Levanta-se de uma vez. O chão gelado contrasta com a pele quente. Mas não pode parar. Não deve duvidar. Marcha até a janela. As duas folhas agora abertas. Deixa a chuva, o vento e o canto lhe atingir de uma vez. Dilui-se em  meio ao medo, o canto e a água.







quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Prestes a desabar


O mau humor negro
fecha o céu
finaliza mais cedo o dia

Voam e pousam e voam e gritam
o bando inquietos

Querem se abrigar

O mundo prestes a desabar
Eu ainda não tenho para onde ir

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Você tem certeza?



Na indicação para tocar a campainha somente uma vez, um adesivo vermelho com letras brancas, sorrateiramente colocado ali, grita "VOCÊ TEM CERTEZA?". O dedo paira no ar ante a pergunta incisiva  Ela parece ser feita diretamente para ele. Não, não tem certeza.

Dá um passo atrás, olha para os lados. Os outros apartamentos parecem vazios. As portas enfileiradas estão tão fechadas com tanta certeza que ele duvida que algum dia estiveram abertas. O corredor está mortalmente silencioso e abafado. Ele olha o relógio, há horas parece parado. E se ainda não fosse a hora? Iria incomodar, não queria ser um estorvo para ninguém.

O relógio se nega a lhe informar as horas certas. Um resquício de luz risca o corredor vindo de uma fina janela alta. Não consegue definir nem se lá fora é dia ou noite.Será que ele se atrasou? Talvez não haja mais ninguém lá.

Talvez ele não devesse estar ali. Sabe que uma vez dentro do labirinto vai penar muito para sair. Mas algo o imantiza ali. Um fio dourado o prende à porta. O adesivo continua gritando "VOCÊ TEM CERTEZA?".

O velho elevador para. Sua porta abre rangendo. Ele espera que outra alma passe por lá. Não consegue vê-lo aberto, mas o imagina assim. Com o espelho refletindo o quadro da parede oposta no corredor. Espera  companhia. Ninguém vem. E se ele fugisse. Ignorasse o ímã, o fio dourado invisível e corresse para o elevador, apertasse qualquer número e esperasse tudo desaparecer. "VOCÊ TEM CERTEZA?". Não, ele também não tinha certeza disso.

Não há como fugir. Toma o fôlego todo de uma fez, aperta a campainha e espera. Espera o monstro. Espera o mistério. Espera por um pouco de ar. Espera uma resposta. Já não tem certeza de que deveria ter apertado aquele botão. O tempo ainda está suspenso. Talvez dê tempo de pegar o elevador ainda aberto. Faz tenção de ir embora. O barulho da chave quebra a fuga. A porta abre preguiçosamente. A imagem lhe invade o corpo. Um manto vermelho iluminando o rosto branco e pintado. Os olhos castanhos fixaram-se nos seus por um momento.

 - Você veio. Cheguei a duvidar. Está atrasado.

Atrasado?  Não se lembra de ter agendado aquela visita. Não sabe o que faz aqui.A sala minúscula está entulhada de anjos, fadas e cristais. Do teto despencam fios invisíveis com pássaros de papel dobrado. A luminária de cacos de vidro coloridos desenha vários arco iris nas paredes repletas de santos  e magos. Pufes azuis, amarelos e verdes fazem a vez de sofá. Na mesa de canto, observa dois copos dourados com água pela metade, em um deles é possível ver a marca do batom.

O cabelo vermelho contrasta com o robe verde água que ela usa. O colorido a la Khalo o hipnotiza e o acalenta. Precisava estar ali.Assustadoramente, a sensação de aconchego toma conta dele. Ao lado da porta fechada, percebe uma vaca de bronze olhando para ele. Os olhos do animal de bronze lhe atravessam o peito. Desvia o olhar um instante e depois repara que a estátua tem as órbitas dos olhos vazados. Mas a ruiva passou por ali. O cheiro de amaciante, naftalina e incenso faz a cabeça dele girar. Fez uma pergunta e ele é incapaz de responder.

-Gosta de chá de romã com mel?

Não tem certeza que goste. A luz do abajur colorido fragmenta o seu rosto. A janela fechada com grossas cortinas não permitem que ele veja lá fora. Ainda é dia? Tem poucas lembranças antes daquela sala. O bilhete com endereço e horário na rua quente e abafada. O elevador barulhento. O relógio do pulso marcando dez pras seis há muito tempo. O relógio era do seu pai que ganhara de seu avó. As iniciais dele ainda estavam lá. C.B..

-Está com pressa? Não vai antes do chá.

Ela flutuava sobre o chão de madeira com suas pantufas azuis. Seu punho de porcelana parecia quebrar segurando a bandeja com duas chávenas de chá. Não.Ele estava com pressa. Sentia que não precisava mais ir a lugar algum. Começava a ter certeza de que estava no lugar certo.

-Às vezes dói, né?

Sentia o cheiro de avelã da mancha ruiva do seu cabelo. A dor era algo dele. Pessoal. Não queria falar sobre isso. Não queria lembrar dela queimando a alma começando pelo peito e se espalhando até o último fio de cabelo. Quando criança gostava de sentir a onda do mar batendo contra o peito e o derrubado na água. Assim, submerso e zonzo, quase esquecia que ela estava lá. Ela sempre estivera lá.

- Ela te machucou muito? - A voz quente assim perto o perturbava ainda mais. O toque da mão branca e fria no peito o fez estremecer. Parece estátua.- Tome o chá antes que esfrie, ele vai ajudar.

Dentro da xícara na sua mão, no alaranjado do líquido, as letras dançavam. Com custo formou a sentença "VOCÊ TEM CERTEZA?". Não tinha. Nunca gostou de chá. Sempre preferiu whisky puro,  sem gelo.O álcool o ajudava a controlar as vozes, as dores, os sentimentos.  Doce. O chá desceu queimando pela garganta. Mas deu misteriosamente uma sensação gostosa de saciedade. Agora se lembrou de que talvez não tenha comido nada o dia todo. Tenta forçar a memória no que fez hoje. Como aquele encontro fora marcado? O que viera fazer naquele apartamento? Nada. Sua memória recente é um breu infinito.

No aparador perto do espelho na parede em frente ao sofá verde, uma série de fotos em preto e branco, que não havia reparado. Parecem rapazes. Mas, olhando bem, em alguns são moças. Alguns jovens, outros nem tanto. Parecem sérios, porém tranquilos. De quem serão tantos retratos? A ruiva provavelmente tem uma família grande.

Tem a impressão de ver os pássaros de papel (ou os anjos e as fadas?) baterem asas. Não tem certeza. Pode ter sido o vento. Quase pode escutá-las. Chega a sentir o vento no rosto. A moça estava para dentro, no quarto, na sala, ou quem sabe na pequena varanda. Com custo consegue ouvi-la cantar alguma canção antiga, dessas que os ventos cantam para embalar berços esquecidos. Na sala somente ele, os anjos e fadas, os passarinhos, os retratos e a vaca de bronze. Pensa em chamá-la,  mas não sabe seu nome. Talvez pudesse gritar. Os animais de papel em revoada pareciam dispostos a atacá-lo. Os rostos dos retratos o observam fixamente. A voz não sai. Tenta mais uma vez, mas ela parece ter sumido de vez. Nem um murmúrio. Os olhos da vaca atravessam agora seu corpo inexistente.

Sobre o sofá, perto da xícara de chá, somente o retrato de um jovem olhando o relógio de pulso marcando dez para seis. Tenho a impressão de que está sossegado e de que não há mais dor. Mas como ter certeza?




sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Só um toque


Estica os pés, mas não toca a água. Sentada na passarela vê bichinhos pretos voarem entre ela e a represa. Sabe que não existem, são somente a luminosidade que não se dá com a pupila. Eles a incomodam, porém são inofensivos.

Respira fundo. Uma dor lacerante entra perfurando o ombro esquerdo e se aloja na cintura. Sente a espada torcer dentro dela. Conta até dez, inspirando profundamente e devagar, sentindo o ar preenchendo seus pulmões e depois escapando devagar. Se você não pensar na dor, ela some. Ela sempre some.

Final da tarde de inverno. O céu limpo e de um azul doído que lhe incomoda, pois faz os pontos alados brincarem cada vez mais rápido na sua retina. Volta o olhar para água escura, estica a perna o quanto pode, realmente não é possível alcançar a água.

O ar ocupa árido seus pulmões. O mundo pesa em suas costas. O vento bate seco e cortante. Um redemoinho nos cabelos meio longos, meio morenos. Sua pele anseia por um toque molhado. Só há a lágrima embotada de terra correndo devagar pelo rosto. Quer aquela água toda  subindo pelas pernas e lhe envolvendo no manto gelado.

Não há quase ninguém ali. Ninguém a percebeu sentada sobre na passarela de madeira, balançando as pernas, tentando irritar os peixes que dizem andam por lá. Ninguém deu falta dela. Não muito longe, escuta o barulho do trem.

Ocupa um dos bolsos. A chave na palma da mão lembra que ela tem que voltar. Tudo continua lá à espera dela. Tudo estaticamente como uma fotografia de jornal O retrato da mãe com um meio sorriso na sala, lembrando-a do que deve ser feito. Respira que a dor passa. Zonzeia. Por um instante, parece flutuar sobre a moça sentada na passarela, cujos sapatos pretos e baixos estão alinhados logo ali ao lado. O peito amassado na grade e os olhos pescando peixes inexistentes na água turva.

O celular mudo está no outro bolso, ela se certifica. Nada. Sem toque, sem peixe, sem ar, sem água. Sem nada. Só. Não há quem se importe. Não há quem a perceba. Saiu do escritório como todo dia. Cumprimentou com o olhar os outros , sem palavras, enquanto tomava a rua. Só. Os caminhos em labirinto para pés experientes. Às vezes, o pensamento vageava, mas eles seguiam. Hoje quiseram parar no parque da represa. Talvez precisassem das águas. Talvez precisassem do ar seco. Ou só quisessem parar por parar. Quem vai saber? Quem quer saber? Ela, com certeza, não.

O mundo imóvel no barulho do tem. O ar parado sobre ela. Os pontos bailando sorrateiros. O celular inútil e mudo. Os pés não alcançam a água. O dia trancada com gente que não sabe seu nome. Os peixes não querem aparecer também. Ao lado, os sapatos cansados agora guardam a chave e pedem para ir. Ela não parece preparada para levantar. Os olhos verdes perdidos nas algas que parecem dançar em outra dimensão.

A espada ainda está cravada atravessando o ombro, atingindo o rim. Respira, mas o ar não parece muito disposto a colaborar. Respira que passa. A dor sempre passa. Ela sempre vai. O coração falha. O peso do mundo está no peito. Inspira. Conte até dez. Um. Vai passar. Dois. Sempre passa. Três. Inspira. Quatro. Sente o ar seco tentando ocupar o pulmão. Cinco. Malditos pontos bailarinos. Seis. Se ao menos alcançasse a água. Sete. Um toque. Oito. Só um toque. Nove. Estica mais um pouco e a facada já já some de novo. Dez. Passou. Finalmente o manto gelado e molhado.

Na passarela de madeira, no fim da tarde seca de inverno, agora somente um par de sapatos pretos, baixos e velhos, guardando a chave de um mundo sem dona.








segunda-feira, 15 de setembro de 2014

ouro lunar



lua dourada imperatriz do breu
caminhos quase todos descobertos
estrelas covardes não vão ao campo

o vento uiva uma canção antiga
corre nas árvores seiva iluminada
escondidas e secas nas sombras
as folhas dançam

espelho frouxo
rosto pesado
entre caniços
a face estranha

água ocupa
entorpece o corpo dolorido
esvazia a alma das penas
preenche com metal

cabelo goteja lembranças no chão seco
pele imersa na lua
pensamentos livres em outra dimensão
o ciclo eterno

uma vez mais
vem a aurora
com seus dedos tecedores de  manhãs
são as cores da batalha da vez





Os salgueiros cegos sussurravam segredos seculares aos passantes surdos e cegos que cismam e em prosseguir mesmo assim. Eles não verão o que acontecerá.   Ele chegou de mansinho. O sol ainda hesitava em ir. As sombras formavam imagens e ideias. O som intermitente sossegava a sua alma. Aos poucos, a silhueta delicada se desenhou longe. De onde estava, podia sentir a música que a brisa extraía dos brincos dela tilintando em sua alma. Sua respiração suspensa. A brisa suave e quente no rosto, nunca soube se o calor era do vento ou dele próprio.A procura prosseguia desde o último solstício.

Uma flor lilás desenhada pela luz no bosque, o vestido quase transparente brincava com o vento. Os raios dourados de Apolo refletiam nas folhas secas do caminho e invadiam a alma dele. Eles são de materiais diferentes. Releu a carta para se certificar de que era verdade.Podia ver o arco-íris que formava através das suas asas quase transparentes. Eram mosaicos coloridos de caleidoscópio. Estava irremediavelmente hipnotizado. Ele sabia que não deveria estar ali.

Desde que a viu pela primeira vez passou  a se esquecer dos compromissos diários. Quase não havia mais pelos trançados nas crinas dos cavalos, nem leites azedos nas cozinhas, as tortas de maçã deixaram de sumir das janelas. O bosque andava tranquilo demais para ser verdade, mas era somente a primavera que chegara atemporal  no coração do elfo.

Queria se aproximar, seus pés não correspondiam. A fada assim em um banco formado por raízes de figueira parecia ainda mais inatingível. Ele girou sobre os calcanhares. Pensou em ir embora, abandonar essa ideia louca. A vida sempre fora tranquila, sossegada e alegre com as estripulias entre a obrigação. Será que fora atingido pelo feitiço da flor de Amor-Perfeito. Uma fez se metera em uma confusão sem fim por conta da plantinha. Deveria ir embora. Respirou fundo decidido. Não se moveu. A imagem da flor de lilás sentada riscando o chão com os pés ocupara a sua mente como um tsunami. Por Pã, esses sentimentos o estavam deixando maluco.

.Era claramente um encontro. Ela o esperava tranquila. Seu vestido dançava com o vento leve. Ele deveria se aproximar. Mas o que ele iria falar? Como iria dizer? Onde colocaria as mãos tremedeiras? Queria as mãos dela entre as suas. Queria sentir o ar perfumado por ela. Aroma lilás. Queria somente tocar de leve seus cabelos. Queria muita coisa. mas não se mexia.

O sol começava a dar indícios de que não ficaria muito tempo mais por ali esperando o elfo se resolver. Quando a noite dominasse tudo seria hora das magias e das mágicas, haveria muito o que fazer, sabe que não a encontraria. São de materiais diferente. Afinal, por que estava ali? O bilhete na mão o lembra   do encontro agendado, lembra da espera por outra oportunidade. Olha fixamente para a fada à espera. Ela não ficará ali muito tempo mais.

A vida através dos seus olhos os medos as dúvidas as excitações ficaram para o lado de lá Aqui somente o aconchego a certeza de que nada acontecerá a proteção

Uma palavra. um olhar, um toque, um arrepio, os sentimentos todos em ebulição ao mesmo tempo. Apolo sorriu satisfeito e levou Eros consigo, era necessário terminar o trajeto, logo logo a Lua viria com seu carro.



domingo, 7 de setembro de 2014

As vozes do furacão



Povoada por vozes
frases que não disse
respostas de perguntas perdidas
histórias irrealizáveis
de um passado surreal.

A cabeça no olho do furacão.
Berros.
Exigências.
São tornados ferozes
clamando por atenção.

Será que o rapaz aqui ao lado também escuta?

Pedras pesadas
oprimem o peito
pressionam os dedos na goela.

Não pode respirar.

Sem conseguir carregar
seu maldito fado
sempre com o grito abafado
morrendo pela falta de ar


sábado, 16 de agosto de 2014

Os olhos da noite

O projeto do texto fora feito depois de ver esse desenho de Troche em uma noite de insônia e trabalho. Algumas noites em claro e alguns dias de incômodo foram necessários para desencravá-lo da pele. Ei-lo finalmente.




Não sabia o que era dormir. Sonhar, descansar e deixar a alma pairar sorrateira em outro plano eram coisas cujos significados práticos desconhecia. Quando o mundo se aquietava, ela sentia nos pés a casa sibilar tranquila e sossegada. Satisfeita, levantava e ia com passos rápidos porém curtos, arrastando as chinelas de algodão pelos corredores que sonhavam com dias ensolarados e chuvas verdes. Não tinha pressa. O mundo tinha seu ritmo e ela sabia que eles se completavam, nunca houve competição.

No quarto escuro, a cama ronronava de mansinho. Para ela não havia convite. Do fundo do guarda-roupa costurado à parede, sacava as agulhas e as linhas. Havia muito o que fazer. A noite sempre escura cumpriria sua jornada longa marcada pelo pêndulo do antigo relógio de pé alto  do avô de seu avô. 

De volta à sala, pelas janelas imperiais escancaradas, o vento frio vinha lhe saudar carinhoso e companheiro como um cachorro.Ao redor da cadeira de balanço, ela dispunha suas linhas em cestos de vime, que há muito tempo talvez tivessem guardado cobras do encantador,  e, no seu compasso sutil, punha-se a tecer a noite. Linha negra para noite sem lua. Ia desenhando as constelações, ligando as estrelas e planetas com seus fios prateados. Formava sonhos que não se realizariam. Desenhava as histórias que não terminaria. Formava o véu que cobriria seu dia e cerraria seus olhos nulos.

Cadeira vai, linha vem, balanço volta, fio caminha além. Buscando o fio da meada. Onde se perdera assim? Os olhos vazios na noite negra. As lembranças no dia feliz e quente no balanço da árvore. Não entendia como o traçado do mundo pudesse ser outro. O verde era um tapete borrado sobre sua cabeça, o céu sempre lhe desenhava nuvens mais deformadas no chão. As mãos mecânicas pareciam ignorar o pensamento longe  e continuavam a tecer o que viam: breu ponteado, um enorme tecido poa.

As memórias dançando na cabeça desbotada. Aquela manhã pincelada por cores minúsculas. Sentia o sol na pele e o tecido fino roçar seu braço. Gostava do contato do voil assim. Era um homem, sabia pela maneira como se aproximava, vinha vestido de nuvem. Não lembra seu nome, talvez nunca soubera. Gostou do som de chocolate da sua voz, não da sentença dada. A noite vai se fechar definitivamente sobre ela. O gosto ficou de repente amargo demais. Sua história ficaria assim por terminar desbotada. Tecido inacabado.

Na sala, as mãos buscavam o vermelho e o vinho e, aos poucos, desenhavam as nuvens sombradas, rubras e densas. O fio prata desapareceu. Era possível que viesse a tempestade. Quisera morrer naquele dia, não daria a chance para a vida se apagar assim devagar da vista. Desejara somente guardar aqueles traços borrados e desfigurados que tinha como família e pertenciam a ela. Só e no escuro. Preferia que tudo se apagasse de um só vez. Nunca mais viu o médico com voz de chocolate amargo. As nuvens avermelhadas denunciam a chuva no horizonte escuro.

A cadeira no movimento frenético. Suas mãos tecendo cada vez mais rápido iam vomitando o manto avermelhado da madrugada fechada. Já não havia estrelas. Nem a Estrela d'Alva pôde com a força escura. Em sua cabeça, o breu também dominava a visão. Não haveria mais o que ver. Não havia mais como ver. O desejo pela escuridão definitiva viera intenso quando as últimas sombras de luz e cor se apagaram numa noite e nunca mais acordaram novamente. A madeira do chão lhe dizia agora se era hora de tecer ou de esperar.

Como que de repente, o Sol romperia a trama traçada a noite toda. As últimas gotas de linha vermelho sangue se desenharam assim misturadas ao negro desbotado, ao laranja e ao rosa. A faca para o pulso nunca cumpriu seu propósito. Seguiu esquecida entre hortelã, cebola, coentro e manchada de tomate na cozinha. A vida agora pedia café. Desenhou por fim os últimos raios das mãos da Aurora e rendeu o serviço.

Ela seguia assim, com os olhos de um azul incômodo muito abertos, a vista apagada definitivamente e a alma fechada na sua na infinita escuridão.







domingo, 3 de agosto de 2014

No Ipiranga

Texto desenvolvido durante as aulas de Português pela aluna Letícia Araújo de Carvalho, 5ª série, da escola estadual Ruben Cláudio Moreira em Ribeirão Preto para a Olimpíada de Língua Portuguesa - 2012. 
O poema passou da fase municipal e atingiu a fase estadual.
O trabalho em si foi muito gratificante para mim e creio que para meus anjos/alunos também.

No Ipiranga,
crianças a brincar
soltando pipas pelo ar
são jatos a decolar.

No Ipiranga,
passarinhos coloridos
com seus cantos divertidos
cantam suas melodias
nas árvores
como os artistas cantam suas músicas
nas rádios.

No Ipiranga,
perfume de café de madrugada
e as bicicletas como formigas
saindo para trabalhar com o dia ainda dormindo.

No Ipiranga,
escolas, padarias, açougues
lan houses, mercados e hospital.
O que mais se precisa afinal?

A vida passa devagar
na paz da minha manhã.
O sol acorda tranquilo
o rio dentro do ribeirão.




Nath era uma menina atrapalhada e em um acaso do destino acabou ajudando em uma sessão de fotos ´para o novo cd de uma super banda de rock
essa aproxdimação de nick o chefe da trupe não vai dar certo
os outros intregantes vão ficar com ciumes
o publico tbm
e o antigo namorado tranqueira dela tbm



No clip eles estavam vestidos de ladys antigas e manipulavam umas roupas de ken que tomavam vida e dançavam e cantavam tbm

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Sinais de fogo


Há sinal de fogo
seu olhar como faísca 
queima alma árida
sonhos secos
na vida inóspita

Há sinal de incêndio
sua presença acionou o alarme
o corpo todo em desassossego
coração intranquilo
em ritmo de samba

Há sinal de fumaça
todos percebem o sucedido
a áurea transcende
marca minha vida
minha história
os rios não poderão levar

Energia nuclear
não creio que irá se apagar

domingo, 27 de julho de 2014

Manhã de inverno


O dia amanhece com preguiça de acordar 

Cascata gelada pela torneira 
Mãos não querem se mexer 
Nem a dança do café pela casa muda colabora 
Passos arrastados 
Preguiça em murmúrio, quase uma cantiga de ninar 

Grama coberta por nuvens pesadas 
Pássaros quietos se arvoredam
Tilintar do gelo sendo água
Pele rígida cortada pelo Minuano 
Sol há muito escondido no horizonte 

A vida começa
branco, azul,  amarelo e rosa 
e, ainda assim, não quer acordar


A vida através dos seus olhos os medos as dúvidas as excitações ficaram para o lado de lá Aqui somente o acpnchego a certeza de que nada acontecerá a proteção
Minha vida através dos seus olhos
Minha vida através dos seus olhos

quarta-feira, 23 de julho de 2014

A vida na tarde de inverno



O vento rosa cantava devagar, dançando com as folhas, sujando as roupas, que ela acabara de estender no varal, e pintava seus pés descalços. O céu com nuvens baunilha estava parado em um retrato. Devia ter uns 30 anos, talvez menos, talvez mais, o corpo ainda guardava a mocidade, mas, o rosto, o sol, o trabalho e a vida vincaram profundamente. Trazia o vestido cavado branco amarelado amarrado na altura das coxas. As pernas sustentavam o mundo.

Ela buscou o ar do alto em uma brisa ligeira, seca e sutilmente fria, que lhe navalhou a face, mas deu um suspiro de sossego à alma. Tinha que ir. Seu corpo não respondeu. Sabia que deveria correr. Possuía consciência de que não tinha tempo. Naquele instante, lembrou-se menina e de sua madrinha na cadeira de balanço depois do almoço na varanda "Luiza, a vida é uma estrada muito movimentada que corre para um só lado. Se paras, serás massacrada, menina! Avia!!" Assim, a menina correu, correu, correu pela vida. Mas ela será atropelada. E ela não se mexia.

As folhas secas saltavam das árvores. Esta foi a última chuva que veria. A vida perdeu-se nesse momento. As roupas bailavam com o vento e os galhos nus. Era uma orquestra com folhas, calangos e saguis. A maritaca intrometida quis participar da festa.

Luiza não conseguia respirar. O mundo equilibrado em uma corda bamba. A panela no fogo. A faca suja de legumes na pia. O ar suspenso em poeira terrosa. A risada do menino lá longe. Ela só quis respirar.

O sangue tinto manchou a cena branca. O cheiro de ferrugem lhe feriu o nariz. A louça da pia gritou por ela da janela da cozinha. Mancha de sangue é tão difícil de sair. O sol se escondeu por medo ou por vergonha. Os olhos quase vazios quase castalhos de Luiza buscaram uma resposta. O céu estava calado. A boca estava seca. Havia tanto o que fazer. A casa ainda lhe chamou mais uma vez. Os olhos de Luiza enxutos não conseguiram encontrá-la. Estavam ocos. O vermelho escorreu pelo vestido, misturou-se com a terra e a levou. Depois de todo o corpo seco, suas pernas finalmente sucumbiram.

O mundo de Luiza rolou pela terra árida daquela tarde de inverno.



domingo, 20 de julho de 2014

Sob o céu vivo em azul


O vento frio sai de seus ossos
lhe rasgando por dentro
cortando a pele seca

A falta de ar
põe uma bola de ferro sobre o peito
quer gritar
não há voz
quer chorar
não há água

Os passos são nulos
sobre o pasto seco
indo a lugar algum
não há mais cidade por perto
não há mais quem possa socorrê-la
está morrendo sufocada em campo aberto

O céu vivo em azul
pousa em sua cabeça
Não tem forças para levantar-se
suas pernas a ignoram
o vento toca por seus ouvidos
não quer escutar
seu coração pula pela boca
não consegue respirar
na garganta seca
não há flores

Estica os braços
procura as estrelas
fecha os olhos
quer o calor
sozinha
quer a eternidade
esquecida

Dentro, encontra o caos
quer o silêncio
quer a ausência da dor
quer a paz do universo

Em seu corpo
já não há resposta
está seca
no pasto seco
na noite clara
sem luar
com o firmamento todo a lhe apertar o peito


quinta-feira, 17 de julho de 2014

Pede permissão para se levantar da mesa do jantar. A mãe consente com a cabeça. Ele pula no chão, calça seus chinelos e corre para o quarto. Da janela vê as esperadas luzes novas. Além das companheiras estrelas e da lua viajante e das luzes eternamente amarelas da cidade lá longe, agora ele vê umas luzes coloridas intermitentes. O desenho não deixa dúvidas. É um circo. É igualzinho ao que ilustra aquele livro velho guardado com tanto carinho embaixo do travesseiro.
Veio se deitar antes de todos, quer esse momento só para ele, apagou as luzes do quarto, abriu a janela e ficou esperando a vida acontecer além dos pastos. Quer as luzes coloridas bailando com as corujas que cismam em piar e o galo desparafusado que não sabe que já é quase meia noite. Com algum esforço pode escutar as palmas, o riso, a plat´´eia segurando o folêndo diante do trapézio.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Carta de despedida


Poeminha de despedida para uma turma que insanamente me escolheu para Paraninfa  depois de quatro anos de estudo de literatura no ensino fundamental II. 
Hoje dedico a todos meus alunos que de alguma maneira participaram das loucuras das minhas aulas de livro.


Entre a Pérsia e Troia
Cresceram Sherazade e suas histórias intermináveis.
A seu convite, navegamos nelas
Com nossos barquinhos de imaginação.

Em nossas viagens,
Conhecemos Paris, Londres e até o País das Maravilhas.

Nos juntamos à trupe de Cyrano, Alice, Quixote e Arthur
Para duelar contra os feiticeiros de De Guiche
e os moinhos de vento comandados por Lady Macbeth.

As crianças perdidas
Que chegaram numa segunda chuvosa
Caíram no buraco do coelho
E amanheceram homens no navio de Gulliver.
A impaciente Máquina do Tempo trouxe todos
Direto de 1984 para hoje.

Nos despedimos essa noite de vocês
Mas deixamos que levem consigo
Robinson, Sansa e Agilulfo

E nenhuma ilha será mais totalmente deserta às sextas-feiras.

Que Atena e o Bardo lhes acompanhem sempre.

Professora Laura Sparvoli



quinta-feira, 10 de julho de 2014

Lua cheia


Noite cheia
Lua clara
Caminhos iluminados
Rotas definidas

E eu sigo em paz
Sob o firmamento desestrelado
Apesar dos desafios escondidos
Nas sombras marginais

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Amormar



Amor mar
indeciso
aqui
ali
sem
ponto
sem
final

Amor azul
canino
quer
carinho
lambe
os pés
quer
toque
busca
atenção

Amor ressaca
céu cinza
leva
sonhos
carrega
a alma
inunda
o mundo
para
nunca mais

Às vezes
Amor brisa
vem do mar
incessante
devagar
corta
a pele
molda
a alma
marca
profunda
sentimento
eterno

Amormar
aqui
vinco
cravado
castelo montado
ali
emareado
muro invadido
concha perdida

A onda
veio
levou o mundo
e se foi
sem olhar para trás



Ele já está lá. Pálido transparente, elegantemente vestido com uma camiseta de um vermelho vinho e calça cáqui. Sentado no canto quase escondido no salão quase vazio da sessão de embarque do aeroporto. Ele não percebe a minha presença. Ele não percebe as poucas pessoas que circulam presas ali.  Tem os olhos fixos na parede oposta e longínqua. Os braços cruzados, mãos sob as axilas. Pernas esticadas, pés também cruzados.
Minha conexão de duas horas me encurralou aqui junto a ele. Mas ele está só. Não me vê aqui. Não vê ninguém aqui.O que o trouxe? O que o prende? Os olhos castanhos e vazios me incomodam.  O que veem naquela parede vazia?
Talvez veja seu futuro de daqui a pouco, onde estará quando seu avião partir e chegar. De qualquer modo não parece um lugar muito agradável. Seu rosto é nulo de sensações.
Os outros passageiros em aguardo parecem não notá-lo. Estão todos encolhidos em seus mundos paralelos dentro de celulares, tablets e livros. Mas eu vejo ele esconder seu rosto inexpressivo em suas mãos. Os dedos longos e brancos quase se escondem nos cabelos castanho avermelhado curto. Todo certinho. Cabelo curto. Roupa alinhada bem passada. Rosto nulo.

domingo, 6 de julho de 2014

Qual o elo dourado que me liga ao mar? Por que essa necessidade viceral de sentir esse vento salgado na pele. Sentir a areia e conchas rasgar meus pés. Sentir o Sol queimar minha inércia.

sábado, 5 de julho de 2014

É inverno. Ainda assim preciso chegar. Sou filha do mar. Meus pulmões precisam do vento incessante da maresia. Minh a pele precisa do carinho das águas salgadas. Meu corpo se completa com as cores, formas e cheiros do Atlântico.

Mar

Azul esverdeado
Ou
Verde azulado?
Infinito
Mundão de água
Lambendo a areia
Pontilhada de conchinhas
Brancas
Amarelas
Rosas
Indesisas

O vento sibilando
A antiga canção das fadas
A água tocando
O chocalho de contas
Vem
Nao vem
Tem
Nao tem
Vai
Fica mais
Mais
Mais

Mar sem fim
Lá do outro lado
Existe alguém
Que pensa em mim?

quinta-feira, 3 de julho de 2014

O mar

O coração amarrado com linha e anzol
A vida seguindo a linha das ondas
O mar lambe os pés
A cabeça mal se sustenta

O zumbido no ouvido amplifica o mantra das ondas
"Pode. Não deve
Não pode. Deve"

O azul infinito 
Sem manchas
Sem

domingo, 29 de junho de 2014

Personagens
Evas 1, 2, 3 - Executivas, usam o mesmo taier, scarpan, agitadas, querem um lugar ao sol. De repente percebem q seguir a massa talvez não seja o caminho.
Velha: Senhora idosa, muitos aneis e muitas roupas

Cenário: Café Solar, lanchonete/café  muito lotada, com mesinhas para 2 pessoas, seria interessante que a plateia ocupasse as outras mesinhas.

Cena 1: Eva1 entra no café, tropeçando nos outros e pedindo desculpas. Ela equilibra um copo de café grnade em uma mão e na outra várias coisas: cartão, recibo, celular e um guarda chuva)

Eva1- Café Solar,  definitivamente não é  um nome apropriado para um café nesse dia de chuvanome estranho e quente para uma lanchonete lotada em um dia frio e nublado. O barulho da chuva, misturado com o das conversas e com os toques de celular, a deixa zonza. O cheiro de fritura e café embrulham seu estômago vazio. Os ombros caídos doem.  Equilibra um copo grande de café em uma mão e na outra, o cartão, o ticket e um tablet. 

Entre tropeços e empurrões e caras feias, encontra uma mesa. Suja. Ainda guarda as lembranças do último visitante. Desaba na cadeira. Está esquecido ali um jornal. De quando? Não sabe. Demora para reconhecer que dia é hoje. Olha o periódico, mas não o vê. As letras formam imagens estranhas. Um unicórnio listrado. Uma mãe amamentando o filho. Uma bola de meia em pés descalços. Um corpo jogado na estrada. Vê a si mesma na cena da novela de ontem.

Num suspiro, volta-se para o tablet. O mundo chama por ela de dentro do aparelho. Confere sua agenda da tarde. Ainda falta muito para amanhã. Ainda falta muito para sábado. Verifica a caixa de e-mails. A solução virtual para achar o amor perfeito. A televisão dos seus sonhos para a sala não tem. Mais um convite para mais uma rede social que promete alegria eterna e contatos intermináveis. A lista de aniversariantes da semana. Quem é Antônio Alvarez? Uma a uma as redes não a sustentam muito lá. Os doces também a enjoam.

O líquido quente queima-lhe o céu da boca e a ponta da língua. O movimento é mecânico. Não gosta de café. Sempre pede duplo, forte e sem açúcar. O gosto amargo lhe incomoda o paladar. O líquido incomoda o estômago vazio  O scarpin também a incomoda o pé. Mal pode pô-lo no chão quando chega em casa.  Agora, é impossível tirá-lo, o pé não se acostumaria de novo ao formato do sapato para enfrentar a batalha da tarde. Sente o band-aid apertando o mindinho já sem unha. Os ombros ainda carregam o peso do mundo. Horário de almoço. Queria poder tirar a roupa, esticar o corpo, soltar o cabelo, dormir meia hora e ir. Queria encher o peito de ar.

No jornal perdido, as letras dançam em frente aos seus olhos e formam uma frase estranha: "Ilha misteriosa em Titã". Por que olham para tão longe? Não há ilhas misteriosas por aqui? Com céu nublado, através da janela, mal vê os carros que passam na rua. As pessoas molhadas e desfocadas, tal qual um quadro de Monet. Por um instante quer visitar a tal lua distante. Quer se perder por entre as brumas polares do satélite daquele planeta. Quer a falta de gravidade. Quer a falta de café. Quer todos os anéis de Saturno em um toque.

Na mão, o único anel lhe queima a alma. Tem memória vaga sobre aquele dia. Ele é seu vizinho. Cresceram juntos. Foram para a escola juntos. Ela fazia suas lições, não ligava. Ele entrou na faculdade. Ela ajuda a pagar. O casamento está marcado para quando ele acabar o curso ou talvez a pós. E se passar a lua de mel na ilha titânica? Quer se banhar  no lago de etano. Ligeia Mare, lindo nome para um enorme lago de metano e etano líquido. Quer se deixar afogar. Quer ser pó perdido entre os planetas. Entre aqui e lá, ela é só um pontinho esquecido. Esquecível.

O espelho da parede denuncia o cansaço do dia que ainda não terminou. A chuva fria ou a lágrima solitária escorreu o rímel e desmanchou a máscara. Sozinha em Titã quem comentaria sobre seu cabelo crespo? Sobre sua cara limpa? Quem gostaria de saber sobre a última dieta da moda? A quem incomodaria os dois quilos a mais ou a bolsa da moda ou o limite do cartão?

Na mesa a frente, uma velhinha de cabelos borrados mastiga seu pão molhado no café. O pão esfarela pingando roupa infinita. Ela sente náuseas, mas não há nada no estômago. Os dedos cheios de anéis sujos de manteiga. Mãos enrugadas vincadas pelo tempo. Por onde andaram? Que sóis e que mares banharam aqueles anéis e aqueles caminhos? Os óculos perdidos no rosto branco embaciam pelo calor do café. Os olhos dela turvam pelas lágrimas que brotam. Aquela figura com os cabelos manchados e bagunçados, colares coloridos,cachecol roxo e mãos sujas a hipnotiza. Quer saber a sua história. Quer vê-la sem suas marcas. Será que já visitou a ilha misteriosa da lua de Saturno?

A velha ergue os olhos e atravessa os dela. Há um vazio infinito ali. Um buraco negro. O vácuo inexpressivo. Reconhece a si mesma naqueles olhos nulos  e se perde de vez entre o café e Titã.


Sonho impressionista


Poema inspirado no conto Onírico de Jack Duarte e na música Lilac Wine.


O corpo brilha dourado
sob o céu de baunilha
o vento suave e doce
penetra em  seus poros
cantando cantigas medievais
o orvalho úmido e frio
o abraça e o aconchega

Ela está lá
embaixo de uma árvore de lilases
o perfume colorido lhe desenhou o caminho
rosa, verde, amarelo
era uma aquarela  impressionista

Juntos
mundo suspenso
mal pode escutar sua respiração
coração bate em descompasso
tem medo

Mão nas mãos
seus mundos se misturam
seus temores se misturam
suas angústias se dissolvem
seus sonhos os embalam
ele busca nos olhos ao lado
a força para vencer a montanha

Segura seu rosto
se embriaga com o perfume de maçã
seus cabelos são o esconderijo perfeito para mãos dele
perdem-se na eternidade daquele instante

"Finalmente está aqui"

Todo o resto se derrete
como desenho de giz na calçada
depois da chuva

O tremor ignorado
agora, e cada vez, mais forte
o abraço apertado não impede que se vá

Ele acorda no quarto escuro
silêncio sem fim
Dela, guarda  na boca o nome gravado

Na cama ao lado
o buraco da noite
vela os fantasmas do medo
suspensos em árvores lilases









segunda-feira, 23 de junho de 2014

A ilha misteriosa de Titã


Café Solar, nome estranho e quente para uma lanchonete lotada em um dia frio e nublado. O barulho da chuva, misturado com o das conversas e com os toques de celular, a deixa zonza. O cheiro de fritura e café embrulham seu estômago vazio. Os ombros caídos doem.  Equilibra um copo grande de café em uma mão e na outra, o cartão, o ticket e um tablet. 

Entre tropeços e empurrões e caras feias, encontra uma mesa. Suja. Ainda guarda as lembranças do último visitante. Desaba na cadeira. Está esquecido ali um jornal. De quando? Não sabe. Demora para reconhecer que dia é hoje. Olha o periódico, mas não o vê. As letras formam imagens estranhas. Um unicórnio listrado. Uma mãe amamentando o filho. Uma bola de meia em pés descalços. Um corpo jogado na estrada. Vê a si mesma na cena da novela de ontem.

Num suspiro, volta-se para o tablet. O mundo chama por ela de dentro do aparelho. Confere sua agenda da tarde. Ainda falta muito para amanhã. Ainda falta muito para sábado. Verifica a caixa de e-mails. A solução virtual para achar o amor perfeito. A televisão dos seus sonhos para a sala não tem. Mais um convite para mais uma rede social que promete alegria eterna e contatos intermináveis. A lista de aniversariantes da semana. Quem é Antônio Alvarez? Uma a uma as redes não a sustentam muito lá. Os doces também a enjoam.

O líquido quente queima-lhe o céu da boca e a ponta da língua. O movimento é mecânico. Não gosta de café. Sempre pede duplo, forte e sem açúcar. O gosto amargo lhe incomoda o paladar. O líquido incomoda o estômago vazio  O scarpin também a incomoda o pé. Mal pode pô-lo no chão quando chega em casa.  Agora, é impossível tirá-lo, o pé não se acostumaria de novo ao formato do sapato para enfrentar a batalha da tarde. Sente o band-aid apertando o mindinho já sem unha. Os ombros ainda carregam o peso do mundo. Horário de almoço. Queria poder tirar a roupa, esticar o corpo, soltar o cabelo, dormir meia hora e ir. Queria encher o peito de ar.

No jornal perdido, as letras dançam em frente aos seus olhos e formam uma frase estranha: "Ilha misteriosa em Titã". Por que olham para tão longe? Não há ilhas misteriosas por aqui? Com céu nublado, através da janela, mal vê os carros que passam na rua. As pessoas molhadas e desfocadas, tal qual um quadro de Monet. Por um instante quer visitar a tal lua distante. Quer se perder por entre as brumas polares do satélite daquele planeta. Quer a falta de gravidade. Quer a falta de café. Quer todos os anéis de Saturno em um toque.

Na mão, o único anel lhe queima a alma. Tem memória vaga sobre aquele dia. Ele é seu vizinho. Cresceram juntos. Foram para a escola juntos. Ela fazia suas lições, não ligava. Ele entrou na faculdade. Ela ajuda a pagar. O casamento está marcado para quando ele acabar o curso ou talvez a pós. E se passar a lua de mel na ilha titânica? Quer se banhar  no lago de etano. Ligeia Mare, lindo nome para um enorme lago de metano e etano líquido. Quer se deixar afogar. Quer ser pó perdido entre os planetas. Entre aqui e lá, ela é só um pontinho esquecido. Esquecível.

O espelho da parede denuncia o cansaço do dia que ainda não terminou. A chuva fria ou a lágrima solitária escorreu o rímel e desmanchou a máscara. Sozinha em Titã quem comentaria sobre seu cabelo crespo? Sobre sua cara limpa? Quem gostaria de saber sobre a última dieta da moda? A quem incomodaria os dois quilos a mais ou a bolsa da moda ou o limite do cartão?

Na mesa a frente, uma velhinha de cabelos borrados mastiga seu pão molhado no café. O pão esfarela pingando roupa infinita. Ela sente náuseas, mas não há nada no estômago. Os dedos cheios de anéis sujos de manteiga. Mãos enrugadas vincadas pelo tempo. Por onde andaram? Que sóis e que mares banharam aqueles anéis e aqueles caminhos? Os óculos perdidos no rosto branco embaciam pelo calor do café. Os olhos dela turvam pelas lágrimas que brotam. Aquela figura com os cabelos manchados e bagunçados, colares coloridos,cachecol roxo e mãos sujas a hipnotiza. Quer saber a sua história. Quer vê-la sem suas marcas. Será que já visitou a ilha misteriosa da lua de Saturno?

A velha ergue os olhos e atravessa os dela. Há um vazio infinito ali. Um buraco negro. O vácuo inexpressivo. Reconhece a si mesma naqueles olhos nulos  e se perde de vez entre o café e Titã.



sexta-feira, 20 de junho de 2014

Na fronteira para outro mundo



Ela vem a passos firmes e rápidos. Embora pouca as sinta, são as pernas que sabem o caminho. A cabeça o desconhece. O calor do bafo do leão ainda está no seu pescoço. É preciso andar cada vez mais rápido. Mais rápido. Rápido, moça. Ele vai alcançá-la. Suas pegadas ficam marcadas no caminho, porém seus pés quase não tocam o chão. É preciso chegar. Aos poucos, o ar fica mais leve e o mato alto lhe arranha as pernas nuas. Já está chegando. Seu peito pode sentir.A adrenalina rotineira lhe trouxe até aqui. A fronteira para outro mundo.

As estrelas vigiam de longe, Marte também está lá. Há esperança de que ela sobreviva a mais esse dia. As corujas observam a visitante. O que busca aqui todo fim de tarde? Olha para o céu. As nuvens vermelhas na noite clara a angustiam e enchem de coragem. A um passo da vida. A um passo da mudança. Este mundo não a pertence. A cada dia a certeza se intensifica. Quer ir além. Quer os caminhos que ninguém percorreu. Prefere as pedras ao asfalto.Vira-se para frente. Elas estão lá. Elas sempre estão lá. As portas para outra dimensão.

Ao abri-las poderá sentir a brisa do aconchego. Tirará finalmente os sapatos. Uniforme e status de um povo que não a representa. Os pés tocarão de leve o chão. Gosta de senti-los aos poucos tomando a forma própria, é a possibilidade de SER longe da opressão de TER. O frio e a conexão lhe subirão pelas panturrilhas e lhe chegarão ao estômago.  Anseia pelo momento em que o ar mágico gradualmente lhe preencherá a alma e os pulmões. Já sente a paz que emana através da porta.

É necessário se desconectar desse mundo que não a reconhece. Mas o celular vibrando no bolso não colabora. Ela quer sair e ainda lhe pulsam quase dentro de seu corpo. Desliga o aparelho. Não quer ser localizada agora. Solta os cabelos.A sensação de liberdade começa a ganhar vida.

 A lua vermelha lhe tinge a pele que assume a coloração natural. O vento assovia uma canção em seu ouvido. Assopra uma mecha avermelhada em seu rosto. Um movimento mecânico limpa sua face e reorganiza a madeixas. Mas isso não tem mais importância. Sua imagem ficará aqui. O mundo para suspenso. Não há mais movimento. Não há mais sons. O relógio perde o sentido.

Silêncio. Só o bater do coração marca o momento. Mais um passo. Uma chuva de sensações. Mais um instante. Abre as portas e entra dentro de si.


sexta-feira, 9 de maio de 2014

Entres as estrelas e a Lua

A janela lhe mostrava
toda noite
quando a casa dormia
as estrelas dançando na varanda

Às vezes
como uma bola prata
a ficar rolando entre os pés das pequeninas
a Lua aparecia linda e prata

Quantas vezes quis sair
brincar de pique com as estrelas
sentir o toque gelado da Lua...

Mas a caxinha de segredos no coração de Mimi
sabia que aquele era um segredo.
As estrelinhas e a Lua brincavam na varanda
em um pacto secreto e silencioso
entre meninas!

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Boa noite


Já é noite!!
A casa toda anuncia
A cama esquecida
aparece escondida
entre roupas e bonecas e cordas e bolas e cobertas.

Só mais um pouquinho...
Não!
Já já eu vou...
Não!
Eu quero brincar...
Não!
Só acabar este...
Não!

Não! Não! Não!
Não há conversa?
Não! Não! Não!
Em marcha e em choro
O biquinho reclamando
mas o sono não veio...

Pela janela vê
a noite cobriu tudo lá fora.
Pela porta vê
os brinquedos descobriram um quarto.

A cama lhe deu um abraço gostoso
Ela sempre foi tão macia?

A menina se aninha gostoso...
e PUF
O beijo e o cafuné trouxeram o sonho todo de uma vez

E lá dentro
entre fadas e cores
ainda escuta falar
"Te amo, menina"
Antes do CLIC a luz apagar.

Boa noite

Mimi no reino encantado da vó Clara


Num sorriso branquinho
Ela chega com seu cabelo de algodão doce
tal como nuvem do céu

quando era menor
(porque agora é muito grande)
queria saber que gosto tinha aquele doce

mas os doces na casa da Vó Clara eram outros doces
nem eram doces de casa de vó
nem eram doces de casa da bruxa

Ali
a vida se adoçava devagar e de repente
um pouco com o gramado azulado num céu verdinho
um cadinho com a martelação sem fim do pica pau
e um tantão com as frutas de todo tipo
e todo jeito

Um portal para um reino distante...
Só Mimi sabia  os segredos encantados
escondidos na casa da vó Clara.



domingo, 14 de julho de 2013

a prof cotinha morreu e citou aninha no testamento, ela vai à sp saber oq teria pra ela, é um livro e um bilhete
no bilhete está escrito: entregar o livro para Ida de Novais em BH
dentro do envelope ainda tem uma grande moeda de prata do estrangeiro
para pagar a viagem e as instruções da entrega
deveriam ir de ônibus, pois d cotinha têm medo de avião
deviam ir em três meninas, pois d cotinha nunca se casou
deviam ir em julho, inverno no brasil, época de encerramentos de ciclos
aninha sai mto brava
saiu de rio preto até sp pra receber algo de herença da sua ex professora do primário e ganhou foi uma missão, volta pra casa com o livro na mochila disposta a esqucer o assunto.
já em casa, dorme e sonh a com d cotinha, a mágica q saia dela enquanto falava e deslizava pela sala, da musica que sua voz virava qdo chegava nos seus ouvidos.... no finzinho do sonho d cotinha olha pra aninha e pergunta: vc tá preparada?

montando a equipe
aninha sabia que tinha q ir pr bh mas com quem e como? não conhece a capital mineira
estuda
no final, vai com uma menina menor Melissa e com Ioshua, não confiaria em ninguem mais a não ser ele... teria q mentir para a tal de Ida....

em BH
se hospedam em uma pousadinha e saem em busca de Ida
mas são constantemente perseguidos
na pousada Ioshua pede pra ver a tal moeda
aninha abre um saquinho onde guarde várias moedas estrangeiras que juntou de amigos: eua, argentina, chile, e duas que ela havia ganhado de d cotinha (uma qdo era criança e outra no testamento)
Ioshua descobre que na realidade as moedas contam uma história nas inscrições e dão indicio pra encontrarem a tal Ida
há flores no caminho
mas há caçadores tbm
batem na porta serviço de quarto é oq dizem, mas na pousada não há serviço de quarto, pegam a bolsa, as moedas e os skates e saem correndo

terça-feira, 5 de março de 2013

depois



depois da onda
somente devassidão
e ausência sem fim

no caminho para casa
flutuando pelas pedras
a cabeça toca o céu
o coração se arrasta na lama
os olhos cegos pela verdade
o instinto dita o rumo

escuto o silêncio profundo
escuto meus pensamentos em transe
escuto meu amor finito
escuto o ar tentando preencher meu corpo

vazio

não há mais amanhã
nem mais planos
nem mais praia
o mundo agora acaba nas margens da estrada
entre a ilusão e meu pouso

e eu
tonta entre ter e nunca ter
em vão
ainda tento a trilha
de volta



domingo, 3 de março de 2013

noite no jardim secreto



eu estou aqui
apesar do vento frio
no cabelo molhado
e da batalha cotidiana
com ossos moídos e mente inteira

a estrela brilha incessante
apesar da lua cheia
esparramada pelo céu
e das nuvens avermelhadas
que passeiam coloridas e escassas

o grilo e a coruja piam
cada um no seu canto
apesar do bicho que passa por perto
(escuto o farfalhar das folhas secas
mas não consigo definir qual seria)

a luz amarela da lua ilumina fracamente o jardim
apesar do caminho aprisionado nas sombras
das grandes árvore
que, imagino, protegem os andarilhos
nos dias de sol

deve ser um bonito jardim
pela manhã
laranja, azul e verde roseado
com joaninhas e formigas
sem grilos e nem corujas

o vento chicoteia meu cabelo
desfaz o dia
traz a noite
todos compareceram
a estrela e a lua
as nuvens
o grilo e a coruja
o bicho indefinido
eu e meu cabelo molhado
mas você não

perdeu
a lua reinando
o vento no rosto
o poema que eu havia escrito
esquecido agora molhado entre as folhas escuras

perdeu
o jardim secreto da minha alma


domingo, 3 de fevereiro de 2013

meu caminho




e se meu caminho estiver nas estrelas?
como segui-lo nessa noite nublada e sem lua?

e se meu caminho estiver nas pegadas que deixei?
como voltar se o vento e a chuva apagaram tudo?

e se meu caminho foi marcado com migalhas de pão?
como disputá-las com a fome?

e se meu caminho for brincando com o precipício?
será que a música do vento nas pedras me sustenta no ar?

na noite escura
não há rua
não há rumo
não há marcas
não há estrelas-guias

no breu total
não há paz
e nem certeza
só a fina linha da esperança
de que amanhã
novamente
o sol apareça

e se meu caminho estiver nas estrelas?
como encontra-lo nessa noite nublada e sem lua?

e se me caminho estiver nas pegadas que deixei?
como voltar se o vento e a chuva apagaram tudo?

e se meu caminho foi marcado com migalhas de pão?
como achá-lo se a
e se meu caminho estiver nas estrelas?
como encontra-lo nessa noite nublada e sem lua?

e se me caminho estiver nas pegadas que deixei?
como voltar se o vento e a chuva apagaram tudo?

e se meu caminho foi marcado com migalhas de pão?
como achá-lo se a com fome não há mais nada?